quarta-feira, 18 de março de 2009

Setor Imobiliário Corre Risco de Viver Nova Crise de Credibilidade

O momento não é fácil para as empresas que atuam no setor imobiliário. Ao contrário dos últimos dois anos, em que as expectativas de bonança acirraram a competição por bons espaços nas grandes capitais do País, supervalorizando o preço dos terrenos e transformando essas áreas em promessas de bons negócios, hoje executivos do setor perdem o sono ante uma possibilidade sombria: não sendo possível prever a demanda, muito menos transformar os terrenos em capital de giro, como manter as taxas de crescimento para 2009 e remunerar os acionistas? A resposta não é fácil, especialmente quando as companhias ainda estão engolindo o impacto da nova lei contábil (lei 11.638 de 28/12/2007), que devorou alguns milhões do lucro líquido de várias delas.
"Já vivemos uma crise de credibilidade no setor financeiro e corremos o risco de enfrentar uma nova crise de credibilidade no mercado imobiliário", afirma Thomaz Assumpção, presidente da Urban Systems Brasil, consultoria especializada em análise de risco de empreendimentos e investimentos. "Não havia demanda para consumir o que foi colocado, ainda assim as empresas estocaram-se de terrenos com perspectivas do que viria a ser, mas não aconteceu", avalia.
Um dos problemas, explica ele, é que não houve um crescimento tão forte assim na base, onde está o déficit habitacional, para atender a oferta do mercado imobiliário. "Não adianta colocar produto popular, quando as pessoas que realmente necessitam não têm crédito para adquirir esses imóveis", diz Assumpção.
E após tantas promessas, Assumpção é cético: "Temos que ver como essas empresas vão pagar a conta e remunerar os investidores na proporção que foi prometido". Segundo ele, recente decisão da Gafisa é um dos maiores indicadores das dificuldades do setor imobiliário.
"A Gafisa surpreendeu ao divulgar que estaria adotando uma postura conservadora em relação aos seus lançamentos, inclusive prevendo cancelamentos de projetos e devolução do dinheiro das pessoas que já compraram os projetos", afirma o consultor. Essa estratégia, avalia, "cria um clima de tensão, ainda muito complicado para o mercado brasileiro, que passou pelo caso Encol. "O fantasma da Encol ainda está presente em muitas pesquisas", diz.
Nos meses de novembro e dezembro do ano passado, a Gafisa trabalhou com um período de pré-reservas mais longo em seus empreendimentos na tentativa de prever a aceitação do mercado. A estratégia mostrou-se como um caminho para tentar prever a demanda. "Esta é uma estratégia efetiva", diz Antonio Carlos Ferreira, diretor de incorporação da Gafisa. Na Brasil Brokers, esta tendência também já foi percebida. "Antes da crise não havia teste de pré-reserva. Os incorporadores não olhavam o mercado e já partiam para a comercialização porque a demanda estava muito aquecida", conta Álvaro Soares, diretor financeiro e relações com investidores da Brasil Brokers.
O executivo afirma que, em média, o período de pré-reservas, que geralmente dura de dois a três meses, tem se estendido 30 dias. Outra mudança é que os incorporadores agora estão exigindo o mínimo de 50% de reservas para lançar oficialmente o produto. Além de esticar o período de pré-reservas, algumas empresas do setor começam a visualizar como uma possibilidade mais concreta o cancelamento do empreendimento, caso as vendas não atinjam um desempenho satisfatório no período de seis meses após o lançamento, conforme assegura a lei. "Mas com 40%, 60% ou 70% comercializado não há possibilidade de voltar atrás", diz Wilson Amaral presidente da Gafisa.
Segundo Orlando Viscardi, diretor de relações com investidores e diretor financeiro da Rodobens Negócios Imobiliários, o problema é que existe uma baixa visibilidade sobre como será a demanda em 2009. "Estamos fazendo como todas as empresas, adequando nossa oferta", avalia.
A Rodobens iniciou no terceiro trimestre de 2008 uma estratégia de redução no volume de lançamentos, "tão logo foi detectada desaceleração na demanda por imóveis novos e redução na velocidade de vendas". Considerando projetos aprovados e que deveriam ser lançados em 2008, mas que forma postergados, ainda sem data definida, a empresa já soma um valor de vendas potencial de R$358 milhões, dos quais R$288 milhões com lançamento anteriormente planejado para quatro trimestre.
Even e EzTec
"Sempre estamos sentindo a temperatura do mercado. Pode ser que um determinado empreendimento tenha o período de reservas mais demorado e o outro não", diz Dany Muszkat, diretor de relações com investidores da Even. A incorporadora teve o seu lucro líquido impactado em menos R$ 20 milhões devido à nova lei contábil, que ficou em R$ 59 milhões. Sem as modificações impostas pela nova lei, o lucro teria sido de R$ 79,7 milhões, crescimento de 165% na comparação com 2007. A receita líquida foi de R$ 825 milhões em 2008, 93% superior na comparação com o ano anterior. O lucro líquido da BR Brokers, que abriu o capital no ano passado, foi de R$ 26,5 milhões no acumulado de 2008, já considerando-se as mudanças trazidas pela Lei número 11.638. Sem estes ajustes, o lucro líquido da empresa no período seria de R$ 58,3 milhões.
De acordo com Emílio Fugazza, diretor financeiro e de relações com investidores da EzTec, a empresa também não está trabalhando com prévias e sim, com o lançamentos isolado de produtos. "Inauguramos o estande para fazer um período de aquecimento e testar as vendas, a fim de saber se o empreendimento terá demanda ou não", afirma. A empresa, que vem adotando uma postura conservadora, fechou o ano com um lucro de R$ 102,1 milhões, resultados que só não foi maior devido as adequações com a nova lei.

Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 9
Cintia Esteves e Regiane de Oliveira

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