sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Imóvel como lastro para crédito

Henrique César Gallo
Jornal DCI


Existem hoje mecanismos capazes de gerar financiamento a baixo custo, sem pôr em risco a ocupação do imóvel

Não é de hoje que se sabe que existe uma grande diferença entre financiamento com garantia ao credor e sem garantia. E mesmo entre os garantidos existem diferenças, que estão traduzidas na taxa de juros cobrada em cada uma dessas modalidades. Trata-se de um princípio básico dos investimentos: quanto maior o risco assumido, maior deve ser o retorno, e vice-versa.

Segundo dados do Bacen, a taxa média de juros cobrada em operação de financiamento para capital de giro de abril a setembro de 2008 era de 17,5% e de outubro de 2008 a março de 2009 passou a 25%, enquanto nos mesmos períodos as taxas de juros para aquisição de bens eram, respectivamente, de 4,5% e 7,5%. Isso mostra que financiamentos lastreados em garantias reais (no caso, o bem a ser adquirido), tendem a ser bem mais baratos que os não garantidos ou garantidos por outros ativos, que não prédios e equipamentos.

É inegável que a crise, que está completando um ano, tornou o crédito mais caro, pois as instituições financeiras que tinham capacidade de fazer novos financiamentos, tornaram-se menos arrojadas nos riscos a serem tomados. Daí que de abril a setembro de 2008, o spread médio cobrado das pessoas jurídicas no Brasil era de 25,4% e subiu para 28,8% a partir de outubro 2008 a julho de 2009. Embora a economia tenha mostrado uma certa melhora, ainda devemos levar mais algum tempo até que tudo volte aos patamares pré-crise.

Por conta dessa relação de risco e retorno, nos períodos de incerteza, os juros cobrados pelos empréstimos tendem a crescer, pois o risco de inadimplência torna-se maior. Por outro lado, também em tempos de resfriamento do mercado consumidor, há a tendência de empresas necessitarem mais de fundos para financiar seus negócios, já que a estagnação (ou mesmo a queda) de vendas pode afetar o giro, aumentando os prazos de estoque.

E o que o empresário pode fazer para obter o capital necessário para sua atividade, a um custo mais acessível? Acredite ou não, a resposta pode estar bem debaixo dos seus pés. Não se trata simplesmente de uma hipoteca ou alienação fiduciária em garantia, que são instrumentos bem comuns no mercado financeiro.

Há algumas décadas, o fato de uma empresa ser proprietária do imóvel onde exercia suas atividades era sinônimo de robustez e idoneidade. Tamanha era a relevância dessa informação que nos cartões de visita havia a inscrição "sede própria".

Segundo pesquisas de consultorias especializadas, o Brasil possui cerca de 80% de suas empresas operando em imóveis próprios e apenas 20% operando em imóveis alugados de terceiros. Nos EUA essa proporção é inversa: 20% das empresas operam em imóvel próprio e 80% operam em imóveis de terceiros. A Europa fica no meio-termo, com 50% das empresas operando em imóvel próprio e 50% em imóvel de terceiros.

Nota-se que no Brasil atual essa vinculação à "sede própria" vem se enfraquecendo ao longo dos anos e hoje não tem grande importância para os negócios comerciais de uma empresa o fato de ela ser ou não proprietária do imóvel de sua sede. Essa perda de importância, a meu ver, se deu por três motivos: o desenvolvimento nacional, que gerou mão de obra mais qualificada não só nos centros urbanos, mas também em outras regiões menores; a tecnologia de logística, que permite que o produtor esteja mais distante de seu consumidor; e pelos remédios jurídicos que tornaram a utilização de imóveis de terceiros muito mais segura para o ocupante.

As duas primeiras razões possibilitam a mobilidade da sede dentro do território nacional e a última protege a ocupação do imóvel enquanto o ocupante estiver cumprindo com suas obrigações.

Assim, uma alternativa bastante viável é a venda dos imóveis operacionais. Pode parecer estranho, mas com o desenvolvimento do mercado financeiro imobiliário, hoje existem diversos mecanismos capazes de gerar financiamento a baixo custo, sem colocar em risco a ocupação do imóvel. Some-se a isso o fato de terem se disseminado no Brasil empresas cuja principal atividade é a compra de imóvel para locação pelo antigo proprietário, sem mencionar fundos de pensão e seguradoras que necessitam manter parte de seus recursos em aplicações de baixo risco.

Embora exista a necessidade de tomar algumas precauções para adotar essa alternativa com segurança, o retorno tende a ser vantajoso. Os benefícios desse tipo de operação costumam vir do fato de que o preço pago pelo investidor pode ser simplesmente colocado em aplicações financeiras, podendo gerar rendimento superior ao valor pago a título de aluguel. Troca-se imobilizado por caixa, aumentando a liquidez.

Há também o fato de que os aluguéis pagos são despesas dedutíveis do IR para empresas tributadas pelo lucro real. Para que se tenha uma ideia, o valor do aluguel é sempre estimado entre 0,5 e 1% do valor do imóvel.

Caso a empresa invista o capital da venda do imóvel em equipamentos, poderá haverá também economia fiscal, com aceleração de depreciação, pois edificações depreciam à taxa de 4% a.a. enquanto equipamentos depreciam à taxa de 10% a.a., diminuindo a base de cálculo do IR sem desembolso.

Outra vantagem vem da terceirização da gestão do imóvel. É possível que se preveja no contrato que vier a ser firmado com o adquirente do imóvel a responsabilidade em fazer benfeitorias no imóvel de tempos em tempos e/ou instalar equipamentos mais sofisticados. Isso libera a empresa para manter o foco de seus administradores no negócio.

Os mecanismos jurídicos para a estruturação desse modelo de financiamento são inúmeros. Há estruturas simples como apenas a venda do imóvel com locação subsequente (sale and lease back), até projetos envolvendo instrumentos legais mais sofisticados como direito de superfície, venda a termo, securitização dos aluguéis como recebíveis imobiliários e etc. A formatação dependerá da necessidade de cada empresa e do grau de segurança exigido pelo investidor.

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